Quase quatro décadas após se ter extinguido em Portugal como espécie nidificante, o abutre-preto recolonizou o país em 2010, resultado da nidificação de algumas aves oriundas de Espanha e graças aos esforços de conservação levados a cabo nos dois países por ONGs e pelas entidades governamentais, em territórios públicos e privados.Embora o número de casais reprodutores tenha vindo a aumentar, a população de abutres-pretos é ainda hoje demasiado frágil, e o seu futuro permanece incerto em Portugal. O novo projeto LIFE financiado pela UE, LIFE Aegypius Return, vem assegurar o regresso definitivo da espécie.
Urgente necessidade de agir
Infelizmente, diversas ameaças ao longo do século XX levaram ao desaparecimento do abutre-preto na maior parte das suas áreas de distribuição na Europa. Portugal não foi exceção – a espécie extinguiu-se no país, no início da década de 1970. As populações espanholas também sofreram um severo declínio, atingindo mínimos de 250 casais reprodutores. Foram então adotadas várias medidas de recuperação da espécie, que incluíram a melhoria do habitat para a espécie, o desbloqueio legislativo para a disponibilização de alimento (por exemplo, em campos de alimentação), a instalação de plataformas artificiais de nidificação, a assinatura de acordos de cooperação com gestores de caça, agricultura e criadores de gado, entre outras. Graças a estes esforços, nas últimas décadas as populações de abutre-preto em Espanha recuperaram e totalizam hoje cerca de 3000 casais. Como resultado, foram sendo registadas cada vez mais incursões destas aves em território português. Em 2010, o abutre-preto voltou a nidificar em Portugal, no Parque Natural do Tejo Internacional. Desde então, mais casais começaram a instalar-se em diferentes regiões de Portugal, mas a população e as colónias reprodutoras continuam muito vulneráveis, o que torna necessária uma intervenção concertada.
Assegurar o regresso do abutre-preto
O projeto LIFE Aegypius Return tem objectivos ambiciosos, mas alcançáveis, para assegurar o regresso do abutre-preto em Portugal e na Espanha ocidental. Até ao final do projeto, em 2027, a equipa pretende duplicar a população reprodutora em Portugal, passando dos atuais 40 casais em 4 colónias para pelo menos 80 casais em 5 colónias, melhorar o sucesso reprodutivo, fortalecer a conetividade entre colónias e baixar o estatuto nacional de ameaça de Criticamente em Perigo para Em Perigo.
Implementar ações de conservação dirigidas
Para consolidar e acelerar o regresso da espécie, a equipa do projeto vai gerir e melhorar 570 ha de habitat em torno das colónias reprodutoras, prevenindo incêndios florestais. O projeto irá também instalar 120 novas plataformas de nidificação, reparar 105 existentes, bem como reduzir a perturbação humana, para aumentar a disponibilidade e segurança dos locais de nidificação. Adicionalmente, irá ainda reforçar a população, libertando na natureza pelo menos 20 abutres-pretos provenientes de centros de recuperação de fauna, em locais estratégicos.
Mitigar as ameaças e reduzir a mortalidade
No entanto, todas estas ações de conservação não terão relevância se não forem eficazmente abordadas as principais ameaças e reduzida a mortalidade da espécie. Para tal, a equipa irá envolver centenas de caçadores na conservação destas aves, promovendo o uso de munição sem chumbo em pelo menos14 áreas de caça, a fim de evitar o envenenamento das aves com aquele metal pesado. Além disso, o projeto irá melhorar a gestão dos campos de alimentação para aves necrófagas e estabelecer 66 áreas de alimentação não vedadas – um novo modelo recentemente aprovado na regulamentação portuguesa – de forma a mitigar a escassez de alimento. Por fim, o projeto irá também trabalhar a capacitação nacional no combate anti-veneno, ao estabelecer duas novas brigadas cinotécnicas com a GNR e trabalhar com todos os intervenientes relevantes para melhorar a gestão, deteção e investigação de crimes contra a vida selvagem e envenenamento ilegal, o que constitui a maior ameaça a nível mundial para os abutres.
Colaboração com vários intervenientes
O sucesso do LIFE Aegypius Return depende da extensa colaboração de nove parceiros e do envolvimento de um vasto número de partes interessadas, que incluem autoridades nacionais, as comunidades locais, conservacionistas, agricultores e caçadores, entre outros. O projeto iniciou da melhor forma, com uma produtiva reunião de arranque e uma apresentação pública no início de novembro, que acolheu interesse e apoio de várias pessoas e entidades.
O projeto LIFE Aegypius Return tem um orçamento de 3.7 milhões e é liderado pela Vulture Conservation Foundation em colaboração com a Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural, a Herdade da Contenda, a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, a Liga para a Protecção da Natureza, a Associação Transumância e Natureza, a Fundación Naturaleza y Hombre, a Guarda Nacional Republicana e a Associação Nacional de Proprietários Rurais Gestão Cinegética e Biodiversidade.